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quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Capítulo 12 de 18

Felicidade

Depois da decisão tomada, parecia que eu tinha tirado um caminhão das minhas costas. Eu me sentia muito mais leve e feliz. O Dr. José Domingos me fez sentir segura em relação à parte fisiológica da gestação e a partir daí era só curtir a nova fase. Eu sempre senti que devia seguir adiante, sofria demais quando pensava na possibilidade de interromper, afinal era o meu bebê. Mas confesso que senti muito medo também. A partir dali, tudo aquilo era passado, e a prioridade era dar todo o amor e carinho para o nosso filho.

Ao contar para as pessoas da nossa decisão, a reação era quase sempre a mesma:

“...Ah, conhecendo a Kelly e o Daniel, eu sabia!...”

“...Vocês estão de parabéns, são uns corajosos!...”

“... Esse bebê é muito bem vindo!...”

“...Vocês tomaram a decisão certa!...”

Ouvimos muitas palavras de força. Meus pais, apesar do choque e preocupação iniciais, nos apoiaram firmemente. Principalmente depois que justifiquei aos prantos que não teria coragem de fazer um aborto, afinal eu já o amava e sentia que era meu filho.

Na semana seguinte à notícia, sem saber, a Gilvete nos presenteou com um livro recém lançado pela Associação Médico Espírita do Brasil: “A vida do anencéfalo – Aspectos científicos, religiosos e jurídicos”. Uma publicação esclarecedora, nos três aspectos que eles se propuseram pesquisar. No campo científico ele explica toda a estrutura cerebral, e define o que é correto e o que é mito ao se falar de anencefalia. No campo religioso, por se tratar de uma publicação espírita, dá subsídios para entender e refletir essa situação. E no campo jurídico, defende o cumprimento e manutenção da legislação em vigor. Em meio a tantas informações, uma me chamou a atenção. Falava sobre o tempo. Justificava a manutenção da gestação porque o tempo de vida é relativo para cada ser humano. Alguns podem chegar aos 90 anos, outros morrem aos 50, uns aos 20 e outros vivem uma hora. Mas todos tiveram a oportunidade de viver. O que vale não é o tempo, mas a intensidade a qual passamos pela vida. O que adianta viver 90 anos de desrespeito, de ódio, de solidão? Se cada um de nós puder ter sentido a experiência do amor, a vida já terá valido a pena. Aquelas palavras fizeram todo o sentido pra mim. Independente do tempo, no meu ventre ou fora dele, eu ia tentar aproveitar cada segundo para transmitir ao meu bebê todo amor que eu sentia por ele.

Voltei a sorrir. Voltei a me olhar no espelho com respeito e com orgulho. Voltei a registrar a evolução da barriga. Ia atualizando a galeria de fotos no orkut para que todos os meus amigos pudessem acompanhar mesmo que à distância. Voltamos a viajar. Na primeira oportunidade, fomos nós três para a praia, em uma colônia de férias do trabalho. Apresentei o mar para o nosso bebê. Apresentei o sol pra ele. Coqueiros. Pé na areia. Voltamos a festejar. A cada oportunidade lá estávamos nós badalando. Dançando. Brincando. Voltei a me arrumar. Passar batom. Lambuzar meu corpo de creme. Vestir roupa justa pra aparecer a barriga. Comprei vestidos pra ficar bem feminina. Fazia questão de parar o carro na vaga de gestante e furar a fila no supermercado, pra mostrar ao mundo que eu era mãe. E estava mega orgulhosa disso. Aproveitei pra fazer manha e pedir pra que satisfizessem os meus desejos. Pra minha mãe pedi gelatina colorida. Pro Daniel, pão de forma, com maionese, presunto e queijo amassadinho, daquele jeito que gruda no céu da boca. Pro pessoal do trabalho, cestinha de frutas em substituição à latinha de balas. Nesse meio tempo, o Daniel me ensinou outra linda canção, e eu voltei a cantar para o bebê.

“Vem a noite, doce e calma,
Doce e calma,
Din Don
Din Don
Din Don”

Simples assim.

Kelly Cecilia Teixeira

4 comentários:

  1. é Kelly....só quem passa por situações assim consegue perceber na essência o q siginica "AMOR INCONDICIONAL"....tem pessoas q acham loucura algumas atitudes q tomamos por amor, mas no final, a gente consegue enxegar com clareza e ter a certeza q valeu à pena e q faríamos tudo de novo, do mesmo jeitinho, só pra fazer quem amamos "feliz"!!!!!! Obrigada por compartilhar essa história linda e dar este exemplo de amor, força e superação!!! Muitas pessoas precisam disso...."EXEMPLOS DE FORÇA E DE AMOR".......cada dia q passa admiro mais vc e o Daniel, pessoas q eu considero muito especiais e q agradeço à Deus por fazerem parte da minha vida, mesmo q à distância......mesmo assim, a vida colocou o Daniel novamente em contato comigo e consequentemente vc e eu fico muito feliz por isso!!!! Quem sabe futuramente a gente não consegue participar mais da vida um do outro...ficaria muito feliz por isso!!! um bj no coração de vcs, fiquem em paz e que Deus abençoe cada dia de vcs!!!!!

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  2. Oi, Gê! Obrigada pelas lindas palavras! Você também não fica atrás com sua história de superação! Vocês são igualmente uma fonte de inspiração para muitos outros pais, e nesse caso, continua a cada dia com cada nova conquista do Nicolas. Também adoro vocês e vamos tentar estar mais próximos! Um beijo!

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  3. Ah Kelly e Dani.. eu sempre digo que tenho 2 filhos, o Pedro que viveu comigo apenas no período gestacional foram 38 semanas, das quais 24 sem que eu ainda soubesse.. é isso mesmo, descobri a gestação com 24 semanas.. e o Ottaviano Augusto, que hoje está com 1 ano, 9 meses, 13 dias e 22 horas e alguns minutinhos!! Hahaahhah.. é isso é ser mãe.. sentir cada gesto, amar incondicionalmente, e saber que aquela vida, que ali está é o que de mais importante você tem. Quando o Ottaviano nasceu.. eu nem acreditava que poderia ser tão importante pra ele... porque eu nunca havia tido tamanha responsabilidade, e no período em que ele ficou na UTI, a assistente social me disse que a mãe era a pessoa mais importante naquele momento.. aí eu respondi.. então eu posso chamar a minha?? Mas é assim mesmo, estou anciosa pelos próximos capítulos!! Beijos!

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  4. Oi, querida. Eu não conheço sua história... Mas pelo o pouco do que li, também me parece uma história de superação! E vc acabou de me dar uma grande idéia! Ao acabar meus capítulos, vou convidar outras mães para escrever cada uma um capítulo de depoimento! O que acha? Beijos.

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