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terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Capítulo 06 de 18

Mudanças

Passada a primeira fase onde as emoções eram todas externadas, compartilhadas com a família, amigos e colegas de trabalho, entramos numa fase de introspecção. Por vezes, deitados na cama, na hora de dormir, eu e o Daniel nos surpreendíamos rindo sozinhos, sem motivo, olhando pro teto de mãos dadas e especulando uma série de situações. O sexo do bebê... possíveis nomes... que fase de desenvolvimento ele estaria dentro da minha barriga... com quem ele seria parecido... como montaríamos o quartinho dele... aí, começava a dar um frio na espinha de imaginar quanta responsabilidade estaria por vir... se estávamos mesmo preparados... como ficaria nossa situação financeira... se saberíamos cuidar direito de um bebê... etc etc etc... mas as preocupações dissipavam em um segundo quando imaginávamos o sorriso dele brincando no tapete da sala. Passávamos horas assim, até o sono chegar e a gente adormecer.


Em tão pouco tempo de gravidez o corpo não havia apresentado nenhuma mudança aparente, ainda mais que por estar fora do peso, as gordurinhas extras escondiam a típica barriga de grávida, que num corpo magro se tornaria muito mais visível. Mas isso não impedia que eu ficasse horas admirando meu corpo no espelho. Com roupa ou sem roupa. Após o banho, então, era quase um namoro. Tratei de usar todos os cremes que eu tinha direito. Passava a mão na barriga com cuidado, espiando de lado, curvando a coluna, brincando de empinar o umbigo. Os seios também recebiam atenção. Como seria amamentar? Será que eles cresceriam muito na gestação? Por vezes, chegava muito perto do espelho pra observar os mamilos. Apertava com delicadeza e dava risada sozinha. Era muito cedo pra sair qualquer substância dele, quiçá leite... Com roupa, a brincadeira era com o travesseiro, fazendo volume embaixo da blusa pra simular como eu seria quando estivesse de barrigão. Em qualquer uma das situações a expressão era a mesma: o sorriso no canto da boca, o suspiro orgulhoso e o olhar apaixonado.

Em casa, pouca coisa havia mudado, mas planos não faltaram. Comprei várias revistas de decoração de quartos infantis, que inspiraram diversas ideias, mas sem saber o sexo do bebê não dava pra fazer muita coisa. Ainda assim, o quarto de solteiro da casa, que até então servia de escritório, estava com seus dias contados. Teríamos que arrumar um outro lugar para o computador e toda a tralha que o acompanha, os livros expostos nas prateleiras, que fatalmente dariam lugar a brinquedos e bichos de pelúcia e a bagunça guardada no armário, que seria transformado em guarda-roupa. Não tínhamos pretensão de mudar as cores das paredes, mas pelo menos decorá-las com adesivos, quadros ou alguma pintura temática. A cama seria transformada em sofá, com bastantes almofadas e rolinhos nas laterais. Faltaria o berço. A poltrona de amamentação. O carrinho. A banheira... No aguardo de todas essas mudanças, compramos apenas duas caixas, de cores neutras, pra guardar os presentes acumulados.

Na hora do almoço não havia muita dificuldade, não sentia náuseas e quase não tive enjôos. A diferença era apenas que não tinha vontade de comer nos lugares de sempre. Parecia que a comida tinha um gosto diferente, embora os chefs fossem os mesmos durante toda a gestação. Por isso, variava o cardápio e tentava almoçar em novos restaurantes próximos do trabalho. À noite, em casa, passei a evitar as guloseimas e me esforçava em optar pelos alimentos mais saudáveis. Era uma tentativa, mesmo que tardia, de me manter dentro de um peso aceitável sem exageros. Tomava também um complemento de vitaminas receitado pela Dra. Tânia, que ajudaria a completar o que faltasse na alimentação, inclusive o ácido fólico.

Não tive nenhum tipo de reação adversa, ou pelo menos nenhuma que aparecesse mais do que a felicidade que estava sentindo. Não tive tonturas, a pressão arterial estava boa, sempre tendendo para baixo, não tive nenhum tipo de dor e nem sangramento. A única coisa que sentia era uma cólica, parecida com a menstrual, mas muito discreta, como se acusasse a mudança pela qual meu corpo estava passando. O único sintoma que não sumia era a ansiedade, desta vez, pela primeira consulta com o meu obstetra, cujo ouvido seria bombardeado pela lista de perguntas que eu estava preparando.

Em meio a tantas novidades, no corpo, na mente e no coração, continuávamos nossa rotina diária. Agradecendo a cada novo dia o presente enviado por Deus.

Kelly Cecilia Teixeira


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