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domingo, 29 de janeiro de 2012

Capítulo 10 de 18

Outras opiniões

No dia seguinte fomos até outro laboratório repetir o exame. Ao entrar na sala, a assistente me ajudou a deitar na maca e toda sorridente perguntava:


- É seu primeiro filho?

E eu desconcertada, olhava discretamente para o Daniel e respondia.

- É.
- Que bacana. Está contente?
- Sim.
- Já sabe o sexo?
- Não.
- Tem preferência por menino ou menina?


Naquele momento, não pude segurar o choro e respondi aos prantos:

- Eu preferia que ele fosse saudável...

Sem entender, a assistente ficou assustada e tentou contornar a situação. Depois que eu expliquei o possível diagnóstico, ela pediu milhões de desculpas. Mas eu a entendia, ela não tinha culpa nenhuma, não tinha como saber.

Quando o médico entrou na sala, meu coração acelerou e fiquei ansiosa em saber a opinião dele. Torcia para que fosse diferente. Não foi.

Ele explicou exatamente como o Dr. Leonardo, mas foi além. Disse que em casos de malformação, justamente devido ao acúmulo de líquido amniótico, a bolsa poderia romper-se abruptamente, ocasionando um descolamento de placenta e a possível perda do útero. Quando ele deu esse parecer, o que parecia trágico ficou ainda mais assustador. Perder o útero? Mas e o desejo de tentar ter outros filhos???

Minha cabeça rodava.

E ele continuava. Seria bobagem manter uma gestação dessa forma, pois caso o bebê sobrevivesse ao nascimento, ele teria uma vida vegetativa. E ainda questionava: “Para quê?”.

Perguntei se era comum esse tipo de caso. Ele respondeu que não e comparando, disse ainda que realiza uma média de 300 ultra-sonografias por mês, e que há 2 anos não via um caso como o meu.

Assustada, ainda tive coragem de perguntar:

- Se optarmos pela interrupção, como ela é feita?

- Existem duas maneiras. A primeira é aplicar um remédio em você, forçando o seu corpo a expulsar o feto, e aguardando-o morrer fora do ventre. A outra é aplicar um remédio diretamente no coração dele, fazendo-o parar de bater. Dessa forma, pode ser que seu corpo entenda que precisa expulsá-lo naturalmente. Dependendo da situação, ainda é necessário fazer uma curetagem.

Enquanto ele explicava as técnicas de abortamento era como se um punhal fosse sendo enterrado no meu peito a cada palavra dita. Era muito cruel.

Ainda assim, ele fez questão de repetir que essa era uma decisão única e exclusivamente nossa.

Antes de terminar o exame, não contive minha curiosidade:

- É possível saber o sexo do bebê?
- Ainda é muito cedo para saber, posso dar alguma informação errada, mas tenho a impressão de ser um menino.

No mesmo dia, à noite, fomos até a casa espírita onde o Daniel é evangelizador. Às quintas-feiras é feito um trabalho de tratamento espiritual, com a palestra para a família e o passe. Enquanto aguardávamos a entrevista, a diretora da casa, Gilvete, chegava e do portão já nos avistou. Vendo nossa expressão de sofrimento, foi logo perguntando o que se passava. Contamos aos prantos e ela ouviu atenciosamente. Ao término da nossa história, ela nos disse calma e carinhosamente:

- Agradeçam ao Pai. Vocês são espíritos de luz e foram escolhidos para dar a oportunidade a esse espírito irmão, que precisa de ajuda. Não temam, pois o Senhor escolhe àqueles que são mais qualificados para as suas missões.

Dizendo aquelas palavras, as primeiras de redenção, as que vinham acalantar ao invés de julgar, as que traziam amor e não desespero, a querida Gilvete conseguiu acalmar meu coração. E pela primeira vez naqueles dias, eu consegui respirar profundamente.

Passamos pela entrevista, assistimos à palestra e tomamos o passe.

Na sexta, conforme combinado, passamos em consulta com o Dr. José Domingos, em um consultório do outro lado da cidade. Chegando lá, vendo que fisicamente eu estava bem, ele comentou que a orientação de procurar o hospital, era porque ele achava que eu estava sangrando. Sendo assim, ele ficava mais despreocupado.

Mostramos os exames e ele confirmou o diagnóstico. Ao saber dos comentários dos outros médicos, disse que achava um tanto exagerados, e que as chances de eu perder o útero, eram as mesmas de eu sair de casa e ser atropelada. Ou seja, existe? Sim. Mas são mínimas. E ainda reforçou que em 19 anos de profissão, mesmo acompanhando gestações de alto risco, ele e a equipe nunca perderam um útero.

Reforçou ainda que não é permitido realizar aborto em casos de anencefalia. E que se optássemos por essa decisão, teríamos muita dor de cabeça em enfrentar a justiça.

Finalizou aquela consulta de urgência com um encaminhamento a um médico especialista em medicina fetal, bastante reconhecido na área. E confirmou nossa próxima consulta no seu consultório habitual, que já estava agendada desde a última vez que nos encontramos.

No dia marcado, fomos eu, o Daniel e minha mãe até o especialista em medicina fetal. Uma clínica bem arrumada, elegante. Na sala de espera encontravam-se diversas revistas e livros. Folheando um desses livros, vi uma reportagem que mostrava uma operação intra-uterina bem sucedida realizada pelo médico o qual aguardávamos a consulta. Naquele momento senti uma pontinha de esperança.

Na sala dele, ansiosos, esperávamos por respostas positivas. Ele olhou os exames e começou a explicar didaticamente o que acontecia. Não falou nada de diferente dos outros médicos, a única diferença foi que ele desenhou em um papel toda a estrutura do sistema nervoso de um bebê, e o que exatamente estava faltando no nosso bebê. Fez uma longa entrevista comigo e com o Daniel, perguntando sobre tipo sanguíneo, possíveis casos na família, grau de parentesco, doenças pregressas e religião. Não trouxe nenhuma novidade. Informou apenas que dadas as informações, não parecia um caso de genética e a causa mais provável era mesmo a deficiência de ácido fólico. Também igual aos outros médicos, disse que a decisão em manter ou interromper a gestação era nossa:

- Os pais é quem devem decidir. Prioritariamente a mãe, pois é ela quem vai carregar o bebê os nove meses, é ela quem vai sentir o corpo mudando e os hormônios em ebulição.

E continuou:

- Porém, acho bobagem manter a gestação.

Nessa hora, minha mãe perguntou se havia algum risco para mim caso eu decidisse continuar.

- Ela corre riscos como qualquer gestante, mas devido à malformação do bebê, ela pode ter complicações na hora do parto.

Meus olhos encheram-se de lágrimas.

- Vou deixar com vocês o modelo de solicitação à justiça, caso vocês optem pela interrupção. Além disso, já vou assinar o laudo alegando a incompatibilidade com a vida.

Assim que terminou de falar, abriu dois arquivos no computador, que já estavam prontos, incluiu apenas os nossos dados e imprimiu. Entregou em um envelope da clínica e orientou que não tínhamos muito tempo, era necessário decidir rápido, porque além do estágio avançado da gestação, a justiça era lenta.
Saí do consultório arrasada. Aquele papel na minha mão ardia como fogo. Não conseguia enxergar nenhuma saída que pudesse acalmar meu coração.

Kelly Cecilia Teixeira


2 comentários:

  1. Oi Kellly!! Venho acompanhando seu blog e me emocionando muito a cada nova passagem! Confesso que a medida que descreve suas emoções lembro das minhas também,, principalmente nesses últimos capítulos de sua história! E então me dou conta como é bom termos o amparo espiritual nesse momento e a confiança em Deus ,que nos guia e nos envolve!! beijos!!

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  2. FI..eu ESTOU ACOMPANHANDO SEU BLOG... muito emocionada e tbm muito,mas muito orgulhosa de vc...como li anteriormente,a minha opinião tbm é a mesma...O Miguel está felicíssimo em ter pais tão iluminados como vc e o Daniel...tinha que ser assim,ele está se recuperando muito bem,e muito mais rápido do que vc imagina,ele voltará pra vcs,porque foi ~e continua sendo tão amado por vcs e tbm por nós que DEUS o enviará para a mesma família,e lhe trará tantas alegrias que vc mesma irá ficar perplexa....Tenha calma, e tente ficar menos ansiosa(eu sei e entendo o quanto é difícil)mas o que é de vcs DEUS não toma,ele modela e devolve....Essa benção está muito próxima...CONFIE EM DEUS SEMPRE...bjs te amo muito minha filha,e cada vez mais me encho de orgulho de vc...

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